quarta-feira, 9 de março de 2016

Cine Kalunga

Cine Kalunga


No início dos anos 2000, eram poucos os documentários ou registros realizados no Sítio Histórico e Patrimônio Cultural Kalunga e os que haviam, nem sempre eram disponíveis como é hoje, com as facilidades de acesso e comunicação que a Internet nos dá.

Um desses filmes, Kalunga, realizado pelos cineastas Pedro Nabuco, Sylvestre Campe e Luiz Elias, documentou toda a história do povo Kalunga, suas lutas, sua cultura, sua relação com o meio ambiente de maneira ímpar.
Essa obra, cujas pesquisas e filmagens tiveram início nos anos 80 foi premiada pelo Júri Popular do XI FICA – Festival de Cinema Ambiental de Goiás de 2009 e depois exibido com sucesso em diversas cidades do Brasil e do mundo.

A comunidade Kalunga solicitou então que o filme fosse exibido para a comunidade durante a Romaria de Nossa Senhora d’Abadia, em agosto de 2011 e, com apoio da AGEPEL – Agência de Cultura Pedro Ludovico Teixeira, foi constituída uma equipe, composta por Paulo Munhoz, Cláudio Mendes, Eudaldo Guimarães e eu, pela AGEPEL, pela cineclubista Carolina Paraguassú como operadora e pelo colaborador o cineasta Frederico Felipe,
partiu então para o Vão de Almas para realizar essa missão.
Após pernoite em Cavalcante, demos início ao trecho mais difícil da viagem pela longa e sinuosa estrada de chão que leva à romaria.

Montamos nosso acampamento, tiramos a poeira no Rio das Almas, lá denominado Rio Branco e fomos definir o local da exibição.

No dia seguinte, 13 de agosto, demos início à montagem do telão e aos equipamentos e recursos para podermos “passar” o filme no horário combinado como Imperador da Festa, de modo a não atrapalhar os rituais e festejos da comunidade.

Passamos a tarde a divulgar boca-a- boca o evento do Cine Kalunga. No início da noite, demos a última chamada nos altos falantes e Carolina deu início à exibição.

As pessoas foram se aglomerando em frente à tela, umas sentadas outras em pé, sendo mais de trezentos os presentes à exibição.

Muitos comentavam, maravilhados, sobre os locais, as comunidades, as pessoas conhecidas, identificando os atores e comentando.
Outros tampavam o rosto ao ver pessoas já falecidas falando no vídeo e também comentavam.

Eu fui passando e conversando com um e com outro para ver a opinião dos presentes quanto ao filme.

Num dado momento, aparece a cena em que o então presidente Lula discursa, dizendo que veio ao Kalunga não apenas para trazer eletricidade e programas sociais.
“Estou aqui com o governador do estado de Goiás, ministros, prefeitos e vereadores para atender a principal reivindicação do povo Kalunga. A titulação das terras!” – disse ele em alto e bom tom!
Os presentes no discurso aplaudiram e festejavam!

Os presentes na exibição do filme se calaram perplexos, pois, nove anos depois,  a maioria dos Kalunga não tinham e ainda não tiveram as terras do Sítio Histórico e Patrimônio Cultural Kalunga devidamente desapropriadas e tituladas!

Foi aí que o “Seu” Tomás virou para “Seu” Domingos e disse:

“ – Ô Domingo! Eu num disse qui o home era mintiroso? Óia a prova aí, ó!”

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